"SÁBIOS MUDOS... MUNDOS FALADORES"O futuro imediato e o passado arquitectónico cruzam caminhos. Um cenário privilegiado em que a semelhança de todos os opostos é evidente, e sobretudo, a manifestação das pulsações arcanas que permitem relacionar-se com a criação contemporânea.
Álvares de Sousa desenvolve uma essência conceptual a que se refere uma escultura autónoma do indivíduo que é, ao mesmo tempo, animal, humana e arquitectónica. Num pretexto de reunir fragmentos da sua identidade, o Autor estabelece paralelismos diversos com o corpo humano, estímulos díspares que desaguam na cultura dos sentidos, disposição mental que se aproxima do maquinal, do sensual ou do cerebrismo, próprio do nosso tempo. E, o Malabarista sacode-se, na corda bamba, em exercícios de coordenação, ou reflexo único da sua existência, perpetuando o espasmo? – Lars Remke definiu o malabarismo como a infinita forma de Arte! – O sepulcro de Beni Hasson, datado de 1.900 a.C., apresenta uma pintura com um grupo de mulheres fazendo malabarismo com bolas. Tão longe… e tão perto! – Discurso implícito, que se manifesta. Uma reflexão de como se organiza a sociedade, diálogo consentido entre o território imediato e o universo. A ordem. O caos. Eros e Tanatos. A Morte e a Vida. Viagem de uma visão subjectiva que, ao mesmo tempo, nos fala do desejo, de estímulos orgânicos ou dos seus elementos oníricos e fantásticos - um espaço antigo que, simultaneamente, se apresenta futurista. E o Busto inclina-se, debruça-se à varanda do dia vindouro, perscrutando o tempo que lhe cabe viver. Uma Mão, aprisionada, acena à Liberdade e desenha o meio de indagar o inconsciente e dele extrair formas essenciais. Trabalhas a parte do instinto, Quim, da natureza animal que nos é subjacente e infringes a derme humana. Desenvolves um discurso com as tuas fontes de inspiração, articulado numa linguagem muito própria, cuja coerência manténs, ainda que deambulando pelos suportes em que transitas – intenção poética de libertar, do seu peso – a escultura. Este o vínculo entre o signo e a ideia, quer dizer, Sábios mudos…mundos faladores – o ícon e o texto remontam às escrituras ideográficas, cuja representação hoje também constitui, não uma forma elementar e eficaz, mas antes a sua própria representação, como conceito. Não é a Arte uma das linguagens de comunicação mais antigas? – Vagueia o pensamento, sintoma das últimas constantes vitais duma sociedade, que se apoltrona, hedionda e auto-satisfeita no horror que a mesma origina e provoca. Neste sentido, nada de especulações vagas sobre o real e o ilusório ou outras veleidades deleitantes. Não esqueçamos que decerto hoje é futuro! Não nos esqueçamos também que ser de hoje ou actual é uma verdadeira redundância – e o pensamento protagonizado pelos humanos propõe uma exaltação ao comportamento, um vasto espaço de interrogação, recorrendo ao sofá, ao equilíbrio instável, às entranhas, estranhas considerações de objectivos, inquietante desde logo, porque “Duas narrativas de uma vida” E o trabalho entende-se concluído porque traduzido num encontro intelectual e afectivo. Une-se pela Cultura o que muitas fronteiras dividem, pois do tempo e do espaço distam a viagem do entendimento. Resta-me agradecer a colaboração e empenhamento do Município de Penela, nomeadamente o Seu Presidente, Exmo Senhor Eng. Paulo Jorge Simões Júlio e ao…., Exmo Senhor Dr. Mário Duarte, ao Exmo Senhor Prof. Dr. Samuel Guimarães, à Susana Paradinha, ao Autor e a todos os que de alguma forma tornaram possível esta Mostra. Acredito que todos, organizadores e fruidores deste Evento, tomamos a decisão de calcorrear encantos e recantos deste espaço, imbuídos do mesmo espírito. Certa de que este comungar de esforços e vontades que se conjugaram pela qualidade e responsabilidade do nome agora aqui trazido, cumpra o seu objectivo crítico, não deixando de Vos trair, antes a significação de potencialidades para encontros futuros. Bem hajam! Guida Maria Loureiro Comissária "Um sofá numa moldura"O sofá, um objecto, lugar de conforto, de individualidade. Mas o sofá, pode devagar, (embora de forma, progressivamente, galopante) … pode… incrustar-se no corpo. Ou melhor entre sofá e dono pode deixar de haver diferença. Lentamente o corpo fica mole, confunde-se tendões e molas, acolchoado e pele, o padrão do tecido de revestimento com o padrão da roupa mais ou menos interior.
O sofá tentou emoldura-lo. Lucidamente retirou-se com toda a dignidade, demonstrando uma necessidade de neutralidade aparente para equilibrar e camuflar a sua maior arma: sair, ou melhor, levantar-se. A moldura com um sofá. Evita o desconforto de um eventual incómodo, consequência do que seria um confronto mais directo. Preserva-se. Guardado e delimitado. A menorização do perigo pelo seu enquadramento. Enquadrado. Rigorosamente delimitado. E portátil. Debaixo do sofá. O tronco tem de se comprimir. Suster a respiração. Fazer força. Apanhar. Puxar. Com uma corda, uma perna arrancada a uma cadeira. O corpo quase que se encaixa na forma inferior do sofá. Resiste, deita a cabeça na alcatifa ou no lajeado de tijoleira, ganha ar, respira outra vez, engasga-se e tosse. Um medo de esmagar a cabeça confunde-se com um prosaico entalar. Um pouco empalidecido, sente o frio do mármore… Fica no chão. Elege-o como lugar. Ganha cores, de novo. Resistência ao sofá. No chão descobre que, apesar da vulgaridade, estar deitado, em superfície plana e rígida, lhe dá uma maior clareza sobre a volumetria do mundo observável. Samuel Guimarães. Julho 07 |